quinta-feira, 30 de junho de 2011

O anúncio do Primeiro-Ministro.

Mudou-se o Governo, mas o assalto aos rendimentos dos cidadãos continua exactamente da mesma forma, sem qualquer respeito pela Constituição. Já aqui tinha dito o que pensava sobre a tentativa de criar uma "contribuição especial" sobre os rendimentos dos pensionistas. Agora o novo Primeiro-Ministro anuncia uma nova "contribuição especial" — que nada tem a ver com esse conceito, diga-se — em ordem a retirar metade do subsídio de Natal através do aumento do IRS já em 2011. Como isso vai ser feito, ainda não se sabe, mas é manifesto que só pode ser feito criando um imposto escandalosamentre retroactivo, contra o que a Constituição expressamente determina, ou desvirtuando totalmente a figura da retenção na fonte, em total lesão das expectativas dos contribuintes. Na verdade, os rendimentos de 2010 já foram tributados, pelo que se o novo imposto for criado sobre esses rendimentos, haverá uma escandalosa dupla tributação, estando-se a lançar pela segunda vez impostos sobre rendimentos, cujos impostos os contribuintes já pagaram. Já se o imposto recair sobre rendimentos de 2011 — por exemplo, aumentando brutalmente a retenção na fonte sobre o 13º mês ou sobre os meses que faltam até ao fim do ano — estar-se-á a desvirtuar completamente a figura da retenção na fonte. Em qualquer caso, parece-me evidente que haverá uma séria lesão da confiança dos contribuintes, que vêem as suas obrigações fiscais permanentemente alteradas. Mas seguramente o Tribunal Constitucional lá deixará passar mais uma vez esta gritante inconstitucionalidade. O que me choca é que quem ganhou as eleições prometendo que haveria reduções de despesa e não aumento de impostos, a primeira coisa que faça seja aumentar os impostos.

Na área da justiça, pareceu-me ainda haver uma inversão de prioridades no discurso do Primeiro-Ministro, quando disse que pretendia agilizar os processos de insolvência. Ora, os processos de insolvência são dos mais ágeis que existem, tanto assim que todos os dias inúmeras empresas e cidadãos são declarados insolventes. O bloqueio no sistema de justiça está antes na acção executiva. É esta que tem que ser urgentemente reformada.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

A sistemática condenação de Portugal no TEDH.

Começa a ser confrangedora a quantidade de vezes que Portugal é condenado no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em virtude de decisões judiciais consideradas violadoras da liberdade de imprensa. Estando Portugal vinculado pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem, não deveriam ser os próprios tribunais portugueses a ponderar cautelosamente se não violam a Convenção as disposições do Código de Processo Penal que restringem a liberdade de imprensa?

quinta-feira, 23 de junho de 2011

A situação no Centro de Estudos Judiciários.

Esta notícia da demissão da actual Directora do Centro de Estudos Judiciários representa mais um duro golpe para esta instituição, depois da extraordinária falta de apoio que ela teve do Governo anterior. É verdade que houve decisões erradas dos seus órgãos de gestão, como o foi a que recaiu sobre o teste copiado. Mas também é verdade que o facto de o anterior Governo não ter permitido a abertura de um novo curso de formação de magistrados ameaçava o seu regular funcionamento, tendo-se chegado a falar em transferir a formação de magistrados para um Observatório da Justiça. Exige-se ao novo Governo uma atitude diferente em relação ao Centro de Estudos Judiciários, em ordem a que ele possa manter o prestígio que sempre teve como escola de formação de magistrados.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

A falta de poderes do PGR.

Mais uma vez o Procurador-Geral da República queixa-se de que não tem poderes suficientes e até diz que a existência do Conselho Superior do Ministério Público prejudica a eficácia da sua actuação. Continuo sem perceber como é que numa estrutura com a importância do Ministério Público, o seu responsável máximo ora se queixa de falta de poderes ora de falta de meios e qualifica o outro órgão da Procuradoria-Geral da República como impeditivo da sua própria actuação. Ninguém tem consciência dos danos que isto causa à imagem do Ministério Público? Será que o Presidente da República e o novo Governo vão deixar que esta situação se arraste por muito mais tempo?

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Os exames no Centro de Estudos Judiciários.

Esta notícia deixa-me absolutamente perplexo. Fui durante vários anos membro do Conselho Pedagógico do Centro de Estudos Judiciários e tenho uma excelente impressão das suas qualidades como escola de formação de magistrados. É por isso com grande surpresa que fico a saber que a avaliação de candidatos a magistrados se encontra presentemente a ser realizada através de testes de escolha múltipla, ainda por cima numa disciplina com a importância como Investigação Criminal e Gestão do Inquérito. E ainda mais espantado fico quando uma suspeita de fraude na realização desses testes de escolha múltipla dá lugar a um despacho como este, em que se determina a anulação do teste e a atribuição a todos os candidatos da nota de 10 valores. Efectivamente, a ter havido fraude, a situação constituiria infracção disciplinar por violação dos deveres inerentes ao estatuto de auditor, perante a qual cabe legalmente sanção disciplinar. Por outro lado, há uma evidente contradição na anulação de um teste e na atribuição de uma classificação pelo mesmo, ainda por cima positiva, a qual não tem evidentemente suporte legal. Será possível que uma situação destas possa hoje em dia ocorrer no Centro de Estudos Judiciários? E os responsáveis máximos do sector da Justiça nada têm a dizer sobre este assunto?

quarta-feira, 15 de junho de 2011

A justiça perante a internet e as redes sociais.

Esta notícia de que um processo em Inglaterra foi anulado pelo facto de uma jurada ter contactado um dos arguidos atrás do Facebook levanta a questão de saber até que ponto as nossas regras processuais estão adequadas à realidade da internet e das redes sociais. Efectivamente, anteriormente os julgadores dos processos apenas conheciam um círculo reduzido de pessoas e o seu conhecimento do caso estava limitado ao que sabiam dos autos e ouviam no julgamento. Hoje, a quantidade de pessoas com que os julgadores podem entrar em contacto através da internet aumentou exponencialmente e é possível descobrir na rede uma série de informações sobre os acusados e sobre o próprio processo. É por isso difícil conseguir evitar que nos casos mediáticos o julgador não seja influenciado pelo que se escreve na internet e pelos contactos que tem nas redes sociais. E o reverso da medalha também existe. Tudo o que o julgador diz na internet fica indelevelmente registado e pode ser conhecido por uma enorme quantidade de pessoas, o que pode implicar que depois lhe venha a sair um caso em que são conhecidas as suas posições públicas sobre o assunto. A ideia da justiça cega à realidade exterior está assim a ser posta em causa pela internet e pelas redes sociais. A nova realidade comunicacional abrange todos, incluindo os julgadores.