No início tive admiração por Baltasar Gárzon, que me pareceu um magistrado corajoso e empenhado em fazer justiça, demonstrando competência nas suas intervenções. O seu momento mais alto foi o processo contra Pinochet, em que apresentou um pedido de extradição muito bem fundamentado, que os tribunais ingleses tiveram dificuldade em indeferir.
Mais tarde, no entanto, comecei a achar que a sua indiscutível competência começava a ser afectada por uma enorme ambição de protagonismo, que o prejudicava. Na verdade, é extremamente difícil a um magistrado exercer as suas funções com a serenidade que se exige, a partir do momento em que ele se transforma numa estrela internacional, sendo chamado a dar conferências em todo o mundo.
Esta minha nova impressão foi, porém, brutalmente confirmada quando Baltasar Garzón tomou em 2008 a iniciativa de querer julgar os crimes do regime franquista, extinto em 1975. Sabendo-se que os responsáveis desse regime estavam mortos e enterrados há décadas, é evidente que esse processo para nada poderia servir, a não ser para fazer política e satisfazer indisfarçáveis objectivos de protagonismo pessoal.
Esta situação só me lembrava o Portugal de 1975 onde, no calor da revolução, se chegou a sustentar que se fizesse o julgamento póstumo de Salazar. Como acho que a Espanha, apesar das idiossincracias de Zapatero, não está a atravessar uma época semelhante, pareceu-me óbvio que iria ser levantado algum processo, face a esta estranha conduta do magistrado.
Tal demonstra os riscos de misturar o exercício da justiça com o protagonismo mediático. Quem se deixa ofuscar pelos holofotes pode deixar de conseguir ver a realidade.