terça-feira, 30 de abril de 2013

O caso Mohamed Aziz v. Catalunyacaixa

Só agora tive possibilidade de ler o acórdão que o Tribunal de Justiça da União proferiu no caso Mohamed Aziz v. Catalunyacaixa (processo C-415/11). Trata-se de uma decisão bastante importante, que considera desconforme com a Directiva 93/13 o art. 695 da Ley de Enjuiciamento Civil espanhola que exclui a possibilidade de deduzir oposição à execução hipotecária com fundamento no carácter abusivo das cláusulas do empréstimo, exigindo a dedução de um processo autónomo que não suspende a execução.

Salienta-se que neste caso o devedor tinha cessado pagamentos ao banco em Junho de 2008, o que o levou a mover a execução hipotecária em Março de 2009, sendo em Janeiro de 2011 a casa atribuída ao banco por 50% do seu valor. O contrato previa uma cláusula de juros de mora de 18,75% automaticamente aplicáveis aos juros não pagos na data de vencimento sem necessidade de reclamação.

O Tribunal limitou-se a considerar desconforme com a Directiva esta limitação da oposição no processo executivo, e a impossibilidade de suspensão da adjudicação ao banco, que considerou susceptível de estabelecer um desequilíbrio excessivo em relação aos consumidores. E de facto parece estranho que alguém possa ser sujeito a uma taxa de juro de 18,75%, ao mesmo tempo que o seu credor hipotecário recebe na execução a casa por metade do valor. Assim, não custa compreender a onda de execuções hipotecárias que atinge a Espanha.

domingo, 21 de abril de 2013

Sentenças criminais negociadas?

É muito interessante este artigo de Francisco Teixeira da Mota sobre a prática de negociação de sentenças criminais, a que o Supremo Tribunal de Justiça acaba de pôr cobro. Devo dizer que pessoalmente não me escandalizaria que o legislador adoptasse essa solução, o que permitiria uma muito melhor gestão de recursos e de eficácia do processo penal. É manifesto, no entanto, que a mesma só pode resultar de Lei da Assembleia da República e nunca de orientações do Ministério Público. Bem andou por isso o Supremo Tribunal de Justiça ao decidir inviabilizar essa solução.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

O pagamento dos subsídios.

Já se sabia que o Governo anda completamente à deriva. Mas ainda não sabia que, como no anúncio da ZON, até consegue viajar no tempo. Assim, depois de durante quatro meses me terem indicado no recibo de vencimento que me estavam a pagar o subsídio de Natal em duodécimos, agora fazem um rewind e dizem-me que os duodécimos afinal são relativos ao subsídio de férias e que o subsídio de Natal pagou a ser pago em Novembro. É difícil encontrar maior amadorismo e desprezo pelas regras que o próprio Governo estabeleceu. À semelhança do Natal, que é quando um homem quiser, os subsídios são pagos quando o Governo quiser, o qual até pode alterar retroactivamente a qualificação dos subsídios que pagou. Se o disparate pagasse imposto, só o dinheiro a arrecadar deste governantes chegaria para cobrir o défice.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Outra condenação de Portugal no TEDH.

Mais uma vez Portugal é condenado no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por atrasos na justiça, e desta vez com uma indemnização milionária. A questão é que, com os cortes que vão ser decretados em todos os Ministérios, seguramente os atrasos na justiça ainda vão aumentar mais. É bom que nos preparemos para recursos sistemáticos ao TEDH perante a falência do nosso sistema de justiça.  E ainda se insiste em sucessivas reformas, cada vez mais disparatadas.

sábado, 6 de abril de 2013

Mais uma desilusão no Tribunal Constitucional.

Confesso que depois das notícias que tinham saído nos últimos dias fiquei com alguma esperança de que o Tribunal Constitucional tivesse finalmente alterado a sua jurisprudência vaga e complacente, para o que poderia ter contribuído a recente alteração na sua composição. Mas não. Este acórdão é mais do mesmo e confirma a minha opinião de que os cidadãos não têm os seus direitos fundamentais protegidos por este Tribunal Constitucional. O acórdão parece aliás um justificativo das decisões tomadas anteriormente, e que tanta polémica causaram. O Tribunal Constitucional insiste que é perfeitamente legítimo efectuar tributações através do corte de salários e pensões e exclui expressamente a aplicação da Constituição fiscal nesta sede, o que constitui motivo de grande preocupação. Ao mesmo tempo legitimou a tributação expropriatória na contribuição extraordinária de solidariedade (CES) dos pensionistas, com o argumento de que o que é relevante é o rendimento que fica após a tributação, o que no limite parece implicar que até uma tributação de 99% seria aceitável para o Tribunal Constitucional. E legitimou também a discriminação gritante que existe na CES, uma tributação que só abrange pensionistas, com o argumento de que da mesma resulta um corte na despesa na medida em que os Estado paga menos pensões pelo que os pensionistas não estarão em situação idêntica que os outros contribuintes. Tudo isto confirma o gravíssimo processo de substituição do texto constitucional por uma jurisprudência vaga e complacente que permite tudo e o seu contrário.

Mas afinal não permitiu tudo. O Tribunal Constitucional lá chumbou duas situações que, a meu ver, têm até menos gravidade que as outras inconstitucionalidades que deixou passar, ainda que possam ter mais impacto orçamental. Uma delas é o corte do subsídio de férias aos funcionários públicos e pensionistas. É, no entanto, curioso que o Tribunal Constitucional se tenha baseado no acórdão anterior que não teria sido cumprido pelo Governo. Efectivamente, ao manter o corte de um subsídio e aumentar os impostos para todos, incluindo os funcionários públicos e pensionistas, estes ficaram em situação pior do que estavam antes, ainda mais discriminados. Isto só significava que o Governo quis brincar com o Tribunal Constitucional. Ora, como este não apreciou a graça, resolveu não apenas repetir a declaração de inconstitucionalidade, como não limitar os seus efeitos, deixando assim o Governo com um sério problema. Tivesse ele devolvido os subsídios e inventado uma outra qualquer solução como uma contribuição extraordinária dos funcionários públicos, solidários à força, e provavelmente para o Tribunal Constitucional o Orçamento estaria na paz de Deus e dos anjos.

É por isso que continuo a pensar que os direitos fundamentais dos cidadãos não estão protegidos por este Tribunal Constitucional e que se impõe encontrar outra solução para a fiscalização da constitucionalidade. Se isto continuar assim, a Constituição deixará pura e simplesmente de existir.

terça-feira, 2 de abril de 2013

O desrespeito pelos Tribunais.

O que caracteriza um Estado de Direito é que as decisões dos Tribunais são obrigatórias e sobrepõem-se às de quaisquer outras autoridades, como entre nós dispõe o art. 205º, nº2 da Constituição. Este comportamento dos partidos da maioria em insistir na oficialização de uma candidatura às autárquicas, ignorando que já existiu uma decisão judicial que a inviabilizou, representa uma afronta aos tribunais.  Esta atitude só significa que consideram que Portugal já não é um Estado de Direito. É provavelmente um ensaio do que se preparam para fazer perante uma futura decisão do Tribunal Constitucional sobre o Orçamento de Estado.