domingo, 29 de maio de 2011

Em defesa das vítimas.

Infelizmente, aquilo a que habitualmente assistimos por parte da comunidade jurídica é um discurso altamente desculpabilizador para os acusados, enquanto que as vítimas são completamente esquecidas. A Justiça é criticada por exercer as suas competências, quando o que se deveria antes criticar é o défice na sua actuação e na actuação das forças de segurança que permite a ocorrência de crimes graves. Deixar que um sentimento de impunidade se instale na sociedade e que os cidadãos sintam todos os dias receio pela sua segurança é algo absolutamente insustentável e muito perigoso.

Sejamos claros: eu não aceito que no meu país uma jovem de 13 anos seja bárbara e cobardemente agredida, mesmo depois de estar caída no chão, para gáudio de uma assistência que nada faz para parar com essa agressão. Não aceito que esse acto seja filmado para se guardar um registo do mesmo como se tratasse de uma festa. Não aceito que o filme respectivo seja colocado numa rede social para exibição da violência, amplificando consideravelmente os efeitos da agressão. Tudo isto é gravíssimo e a sociedade não pode fechar os olhos.

Em relação a isto, há dois tipos de reacções possíveis. Uma é o discurso já habitual da falta de meios, usado pela Procuradoria-Geral da República, que referiu não ter meios para controlar o que se passa nas redes sociais. Outra é a aplicação imediata da lei na sua totalidade perante casos destes, que foi o que fez o Senhor Juiz de Instrução ao decretar a medida de coacção máxima perante o alarme social causado pelo caso. A meu ver, é esta última a resposta que tem que ser dada pelo sistema de justiça.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

As consequências do Código da Insolvência.

Leio no Jornal de Negócios de hoje que "o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas tem que ser revisto até Novembro deste ano, com a assistência do FMI, para facilitar a recuperação de empresas viáveis". Já não é sem tempo. Desde que este Código surgiu, ando em sucessivas obras a referir que constituiu uma autêntica loucura fazer aprovar em tempos de grande crise financeira uma lei facilitadora das insolvências, colocando apenas na vontade dos credores o destino das empresas. O resultado foi o encerramento de milhares de empresas viáveis, com o desemprego dos seus trabalhadores, apenas porque foi essa a vontade dos seus credores. É pena, no entanto, que tenha que vir uma troika do estrangeiro para reconhecer algo que era evidente para qualquer pessoa minimamente informada neste país.

"Vontade política" contra a corrupção.

Em mais uma das suas habituais declarações polémicas, Pinto Monteiro diz agora que é preciso "vontade política" para combater a corrupção. Eu julgava que, sendo a corrupção um crime, a luta contra a mesma deveria ser tarefa dos órgãos de investigação criminal, a saber, o Ministério Público e a Polícia Judiciária, e que essa luta deveria ser conduzida independentemente de qualquer "vontade política" a favor ou contra. É altura de atribuir aos políticos as responsabilidades que efectivamente têm e que, diga-se de passagem, não são pequenas. Já quanto à condução da investigação criminal, essa não é manifestamente tarefa dos políticos. O combate ao crime é da competência dos tribunais e estes devem ser absolutamente independentes do poder político.

terça-feira, 3 de maio de 2011

A inexistente reforma da acção executiva.

Este artigo que surge hoje no jornal Público, assinado pelos membros da Comissão de Reforma do Código de Processo Civil, é elucidativo como exemplo da forma infeliz como se fazem reformas na Justiça em Portugal. O artigo deixa claramente entender que o impulso reformador do Ministério da Justiça neste Governo esteve exclusivamente nas mãos do Secretário de Estado João Correia, o qual decidiu até presidir a esta Comissão. Quando este sai do Governo em Novembro de 2010, alegadamente incompatibilizado com os outros responsáveis do Ministério, a Comissão passa a ser praticamente ignorada, até que recebe um comunicado do Ministro da Justiça em Janeiro de 2011, a dizer que não havia condições para esta continuar. E com isto se perde um trabalho de meses de uma comissão numa área que necessita urgentemente de reforma.

Infelizmente é esta a realidade a que assistimos todos os dias no sector da Justiça em Portugal. Trata-se de um sector em que as reformas necessárias nunca vêem a luz do dia, sendo substituídas por medidas experimentais elaboradas por quem acha que os operadores judiciais devem ser cobaias para os seus ensaios legislativos. E depois há sempre um qualquer observatório preparado para observar o desastre da experiência e propor a experiência seguinte. E sobre os resultados das experiências ninguém presta contas, mesmo quando, como é o caso da acção executiva, se transformou o país num paraíso para os devedores. O que se diz hoje aos cidadãos e às empresas que tentam desesperadamente cobrar os seus créditos e vêm a acção executiva bloqueada? O Ministro da Justiça não deveria dar explicações sobre este assunto?