sexta-feira, 30 de junho de 2017

Como o Diário da República é verde!

Acabei de reparar na magnífica cor verde do Diário da República de 12 de junho de 2017, a qual é explicada assim: "Nos termos do Despacho n.º 5166/2017, de 9 de Junho, este Diário da República, publicado em cor verde, destina-se a assinalar as deliberações tomadas pelo Conselho de Ministros relativos às florestas, realizado a 21 de março de 2017". Descontando a piroseira da iniciativa, cabe perguntar como é que tão pouco tempo depois desse Conselho de Ministros dedicado às florestas, afinal ocorreu a tragédia de Pedrogão Grande. Acho que ficaria melhor que, em consequência dos incêndios, a cor do referido Diário da República fosse rapidamente alterada para preto. Quanto mais não seja em virtude da vergonha que tudo isto representa.

Um comentário:

Gabriel Órfão Gonçalves disse...

«Acho que ficaria melhor que, em consequência dos incêndios, a cor do referido Diário da República fosse rapidamente alterada para preto.»

Caríssimo Sr. Professor Doutor Menezes Leitão:

Era bom. Mas já fizeram sair outro com o mesmo fundo verde: o DR Série I de 17 Agosto 2017 (nº 158).

Et pour cause: uma pessoa fica verde quando lê o nº 4 do anexo da página 4762, 1ª coluna. (Está em causa uma alteração feita ao DL 124/2006, que, como se verá já abaixo, é um DL... absolutamente fundamental para a defesa da floresta - e de vidas humanas!)

Diz esse n. 4: «4 — No caso de infraestruturas da rede viária às quais se associem alinhamentos arbóreos com especial valor patrimonial ou paisagístico, deve ser garantida a preservação do arvoredo a aplicação do disposto nos números anteriores numa faixa correspondente à projeção vertical dos limites das suas copas acrescida de uma faixa de largura não inferior a 10 m para cada um lado.»

Já descobri qual o DL que lhe deu aquela inenarrável redacção: foi o DL 17/2009, Diário da República, 1.ª série — N.º 9 — 14 de Janeiro de 2009 (pág. 279 para 280).

Um diploma alterado variadíssimas vezes - o DL 124/2006, sobre protecção contra incêndios e sobre a floresta («1 — O presente decreto-lei estrutura o Sistema de
Defesa da Floresta contra Incêndios.») - e nunca ninguém reparou na língua de trapo com que aquele preceito foi escrito!

Uma vergonha, tudo isto!

Mas esta gente não lê o que propõe e vota?

Quer o Governo de Sócrates quer o de Passos Coelho quer o de António Costa mexeram neste DL.

O primeiro deu, com o DL 17/2009 aquela redacção ao art. 4 do anexo já referido;

o segundo voltou a mexer no diploma (DL 83/2014) para alterações muito ligeiras, mas ninguém teve o trabalho de o ler todo (de contrário, teriam lido, se com atenção o fizessem, aquele trecho desgraçado);

António Costa, por fim, faz-lhe a mais extensa revisão: mas também ninguém leu o disparate que se encontra lá (página 4762 do DR Série I de 17 Agosto 2017 (nº 158)).

Quem quiser é só pedir-me os DR em pdf. Tenho todo o gosto em enviar. Escusam de ter o trabalho que tive (e que não foi assim tão pouco) para perceber, num diploma já alterado cinco vezes, qual acto normativo tinha introduzido aquela miséria de linguagem.
Podem contactar-me para gabriel.orfao.goncalves@gmail.com