Esta notícia constitui um exemplo claro do estado de degradação que atingiu as nossas instituições democráticas, que se faz sentir principalmente na área da justiça. Efectivamente é absolutamente inaceitável que, quando o Vice-Procurador Geral da República atinge o seu limite de idade, não cesse imediatamente as suas funções e permaneça nas mesmas contra o que a lei determina. Ao mesmo tempo, a pedido do Procurador Geral da República, com o parecer favorável do Conselho Superior do Ministério Público, o Governo tenta alterar a lei vigente mas, verificando-se que não consegue maioria no Parlamento para o efeito, mantém-se o Vice-Procurador Geral da República em funções. Com isto, o Ministério Público, a quem compete nos termos do art. 219º, nº1, da Constituição defender a legalidade democrática, acaba por dar um exemplo inaceitável ao país, mantendo uma situação de ilegalidade no seu órgão máximo.
Durante a minha vida, assisti a imensas jubilações por limite de idade de professores universitários, magistrados e altos funcionários públicos. São sempre momentos de tristeza para os próprios e para as instituições que serviram, especialmente quando em muitos casos era patente que continuavam em condições de continuar a desempenhar o cargo com o brilhantismo que nele sempre tiveram. Todos sabiam, porém, que existia uma lei geral e abstracta que os impedia de continuar em funções e encararam esse processo como uma normal consequência da lei da vida, segundo a qual não há pessoas insubstituíveis e há sempre que dar lugar aos novos. É por isso incompreensível qualquer tentativa de alterar uma lei a pretexto de um caso particular, que dá um péssimo sinal a toda a sociedade. E é ainda mais incompreensível que, não sendo essa alteração à lei aprovada, a Procuradoria-Geral da República não aplique a lei vigente, como lhe compete.
O Ministro da Justiça foi muito rápido a criticar o discurso de Passos Coelho sobre a justiça. É estranho, no entanto, que não se lhe tenha ouvido uma palavra sobre esta situação.
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