Não posso concordar com a decisão aqui noticiada, que não está em conformidade com decisões contrárias existentes noutros países.
Efectivamente, a jurisprudência norte-americana tem invocado a
liberdade religiosa, prevista no Primeiro Aditamento à Constituição, em ordem a
permitir o gozo pelo trabalhador dos feriados correspondentes à sua religião. Assim, no
caso Sherbert v. Verner 374 U.S. 398 (1963) o Supreme
Court considerou ilegítimo o despedimento de um trabalhador, adventista do
sétimo dia, por se ter recusado a trabalhar ao sábado, considerando que obrigar
o trabalhador a essa opção onera o livre exercício da sua religião. Também no caso Hobbie
v. Unemployment Appeals Commission of Florida 480 US 136 (1987) em que uma trabalhadora comunicou ao empregador que se tinha convertido à igreja
adventista do sétimo dia, pelo que se recusaria de futuro a trabalhar à sexta à
noite e aos sábados, tendo sido por isso despedida e recusado o
subsídio de desemprego, o Supreme Court
considerou que o trabalhador que mudou de religião pode recusar-se a trabalhar
nas condições que anteriomente praticava, pelo que o subsídio lhe seria devido.
Tenho, por isso, defendido que, embora o empregador não esteja legalmente
obrigado a permitir a observância de dias de descanso diferentes dos legais, terá por força da boa fé
um dever de o permitir, sempre que tal não lhe causa prejuízo. Ora, estando em causa uma organização de turnos, não se vê o que pode impedir os turnos de serem organizados por forma a permitir a observância dos dias de descanso religiosos.
3 comentários:
A possibilidade da magistrada não realizar turnos ao sábado implicaria a sua substituição por outro magistrado que também tem direitos (direito a estar com a família no respectivo período de descanso, por exemplo). Em que é que a liberdade religiosa se sobrepôe a tais direitos-deveres familiares que também têm consagração constitucional, por exemplo? Se se cria uma excepção para a liberdade religiosa por que não criá-la para outros direitos igualmente relevantes? Ou, por outro, se se admite a restrição destes direitos, por que não da liberdade religiosa? É isso que, salvo o devido respeito que é muito, não consigo compreender na posição do post e, em geral, na reacção a esta decisão do CSM. Parece-me que, a respeito de um moralismo a respeito da liberdade religiosa se estará a permitir uma desigualdade sem justificação, traduzida no sacrifício de alguns para que outros possam gozar de um direito. E isto sem cuidar de que os sacrificados têm igualmente direitos cuja restrição, no entanto, se admite como inquestionável.
Se os magistrados se servirem um ao outro (um guarda o Domingo e o outro o Sábado), qual a dificuldade em realizarem essas trocas de turnos?
Não vejo a dificuldade em entender a posição deste post.
Nunca é demasiado repetir isto nos dias de hoje, haja liberdade religiosa.
Salvo o devido respeito, essa é a resposta de quem não conhece a forma de organização dos turnos. Se determinado magistrado está de turno, isso significa que os outros não estão. E o período de turno, não é apenas o sábado, mas sim a semana. E os detidos têm de ser interrogados no prazo de 48 horas, o que significa que, muitas vezes, terão de ser ouvidos ao fim de semana, designadamente ao sábado (quando sejam detidos numa sexta-feira, por exemplo). E não, não se sacrifica a liberdade do detido para que o magistrado goze a sua liberdade religiosa, assim como não se obriga um outro magistrado a trocar o sábado pelo domingo, sempre no entendimento de que a liberdade religiosa de uns acaba onde a liberdade (sem adjectivos) dos outros começa. Em suma, o que a magistrada da notícia pretende é o reconhecimento de um direito que só é possível à custa dos direitos dos outros, razão pela qual não lhe deve ser dada razão.
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