quinta-feira, 26 de junho de 2008

De novo o Tribunal de Santa Maria da Feira.

O anterior edifício do Tribunal de Santa Maria da Feira estava em risco de ruína iminente, colocando em perigo de vida os magistrados, advogados e funcionários que lá trabalhavam.
Por esse motivo, o Governo viu-se forçado a encerrá-lo, mas manifestamente que se limitou a arranjar instalações provisórias que não satisfazem os mínimos requisitos de segurança.
Por esse motivo, há dois magistrados que no fim de um julgamento acabam agredidos pelos arguidos que acabaram de condenar .
Trata-se de uma situação gravíssima, não só pelos danos causados aos magistrados, mas também pela imagem da justiça, que fica pelas ruas da amargura perante situações desta natureza.
Compreende-se por isso perfeitamente que os magistrados desse Tribunal tenham decidido suspender as diligências até serem arranjadas novas instalações .
O que já não se compreende é que o Secretário de Estado da Justiça não seja capaz de assumir as responsabilidades do Governo pela situação que foi criada, declarando pelo contrário que as agressões nada têm a ver com as instalações provisórias arranjadas pelo Governo, mas antes com "a reacção a uma sentença [que] não tem a ver com o local em que a mesma ocorreu".
Parece que o Secretário de Estado acha que não é de esperar que os arguidos reajam à condenação em penas de prisão, pelo que será irrelevante o lugar onde as sentenças são proferidas. Tanto faz que o sejam num Tribunal em risco de ruína, como num quartel de bombeiros, como até ao ar livre. Quem quiser que chame a polícia.
Se há coisa que tem caracterizado este Governo, desde o primeiro discurso do Primeiro-Ministro sobre as férias judiciais, é um desprezo absoluto pelo funcionamento do sistema de justiça e pelas condições de trabalho dos operadores judiciários. O que mais faltará ainda acontecer para que esta situação se altere?

As mensagens do Bastonário da Ordem dos Advogados.

Recebi no espaço de uma semana três mensagens do nosso Bastonário, dirigidas a todos os Colegas, uma de 20, outra de 23 e outra de 26 de Junho.
A mais importante era a de 23 de Junho, relativa ao sistema de acesso ao Direito, com a qual estou naturalmente em frontal desacordo, mas que corresponde ao programa que foi sufragado pelos Colegas, pelo que nada tenho a dizer.
Embora menos importantes, são, porém, dignas de registo as mensagens de 20 e 26 de Junho.
Na primeira fala-nos que "a Ordem dos Advogados e o Governo vão lançar um programa de oferta de computadores portáteis e acesso à Internet a preços reduzidos, destinado aos Advogados de todo o país". Ficamos perplexos com este parágrafo, que nos indica que os computadores são "oferta" e que o acesso à internet é "a preços reduzidos", perguntando como é que nesta época de crise generalizada o Governo se tornou tão generoso para os advogados.
Mas como, quando a esmola é grande o pobre desconfia, continuamos a ler com atenção a mensagem e verificamos que a tal "oferta" de computadores afinal custa € 150 e que os "preços reduzidos" para o acesso à internet afinal importam entre € 17,50 e os € 34,90, consoante o volume de tráfego pretendido, sendo que ainda obrigam a uma fidelização de 36 meses (!). Não me parece assim que isto seja um "programa de oferta".
Na outra mensagem, de 26 de Junho, propõe-nos a aquisição da Agenda do Advogado 2009, produzida em conjunto entre o Conselho Geral e a Vida Económica, cuja utilidade e conteúdos descreve exaustivamente, ainda nos informando dos preços das várias modalidades do produto.
Não me parece que as competências do Bastonário, constantes do art. 39º do EOA, impliquem propor a aquisição de bens pelos Colegas. Esta atitude transforma as mensagens do Bastonário em comunicações publicitárias em rede, reguladas pelos artigos 20º e seguintes do Decreto-Lei 7/2004, de 7 de Janeiro, o que não é seguramente correcto.
O Bastonário deveria reservar as suas mensagens para assuntos mais importantes.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

A revisão do Código do Trabalho.

É difícil encontrar processo que esteja a correr pior que a revisão do Código do Trabalho. Primeiro, o Governo apresentou propostas de revisão que não passavam de meras declarações de intenção, já que sem sequer eram acompanhadas de qualquer anteprojecto de texto legislativo. Agora, deixa cair a proposta de revisão do despedimento por inadaptação, dando a ideia que nunca a quis seriamente apresentar. Na verdade, compreendia-se com dificuldade que a única proposta de flexibilização dos despedimentos passasse pelo alargamento de um instituto que a jurisprudência praticamente não aplica.

Com esta nova posição, o Governo parecia ter conseguido um acordo com alguns parceiros sociais, que lhe permitiria apresentar uma revisão absolutamente minimalista da legislação laboral, seguindo a velha máxima do Princípe de Salina, em O Leopardo, de que é preciso que alguma coisa mude para que tudo fique na mesma. Sucede, porém, que, numa evidente descoordenação, o Ministro da Agricultura resolve proferir declarações consideradas ofensivas para a CAP, a qual por isso abandona o acordo.

Quero ver se depois de tudo isto ainda se vai celebrar a assinatura do acordo com pompa e circunstância. Seria o cúmulo do cinismo...

terça-feira, 24 de junho de 2008

O Tribunal de Guimarães.

Refere-se aqui que o Tribunal de Guimarães se encontra a funcionar num edifício arrendado pelo Estado a uma empresa, edíficio esse que não se encontra registado na Conservatória nem nas Finanças, onde só consta o lote de terreno.
Será possível que os negócios relativos aos edifícios dos Tribunais sejam celebrados dessa forma? Não me parece que houvesse neste País nenhuma empresa idónea que aceitasse celebrar um contrato de arrendamento de um edifício nessas condições. O Estado está por isso a dar um péssimo exemplo a todos os cidadãos, numa área sensível como a da Justiça, onde o respeito pela legalidade é uma condição essencial.
Mas isto demonstra também a degradação do nosso parque judiciário. Enquanto uns tribunais funcionavam em risco iminente de ruína, como o de Santa Maria da Feira, outros eram instalados em edifícios fantasma, como o de Guimarães. Ao mesmo tempo, o Governo entretém-se a desenhar mapas judiciários no papel. Muito mal anda a nossa Justiça.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

A situação no Zimbabwe.


Não há nada mais revoltante que um ditador ensaiar a realização de eleições, convencido de que se manterá no poder, e perante a clara rejeição popular manifestada em urnas, ameaçar manter-se no cargo à lei da bala. É o que infelizmente estamos a assistir no Zimbabwe de Robert Mugabe. Trata-se de um comportamento escandaloso, pois rouba a legítima esperança de um povo à mudança de um Governo que nos últimos tempos só lhe tem trazido miséria e repressão.

Em consequência desta atitude de Mugabe, o líder da oposição, Morgan Tsvangirai já declarou que não irá participar na fraude eleitoral que todos adivinham, posição que se justifica inteiramente até por receio pelos riscos para a vida e liberdade dos seus apoiantes. Perante esta atitude, o Governo do Zimbabwe responde com um patético apelo à participação nas eleições, quando é incapaz de assegurar que elas decorram de forma livre e justa.

A única pergunta que há a fazer é esta: até quando a Comunidade internacional vai continuar a assistir impotente perante esta grosseira violação dos direitos humanos no Zimbabwe?

sexta-feira, 20 de junho de 2008

O Bloco Central

Refere-se aqui que a estratégia do PSD para as próximas eleições legislativas poderia passar por uma coligação com o PSD, em reedição do Bloco Central que vigorou entre 1983 e 1985. Não estou seguro de que tal seja uma genuína proposta da nova liderança do PSD, parecendo-me mais uma tentativa de criação artificial de factos políticos, de acordo com o estilo habitual de Marcelo Rebelo de Sousa.
Se fosse verdade, era difícil conceber estratégia mais errada em termos políticos. Ninguém irá votar no PSD se souber que as suas propostas de Governo passam pela recondução de José Sócrates como Primeiro-Ministro. Mesmo os pactos de regime que têm sido ensaiados entre os dois maiores partidos correspondem a um claro erro estratégico, pois impedem o PSD, que se deveria apresentar como alternativa de Governo, de propor soluções diferentes nas áreas que os eleitores consideram mais importantes. O exemplo do pacto da justiça demonstrou que o seu único efeito foi amarrar o maior partido da oposição a propostas absolutamente inadequadas nessa matéria.
A nova estratégia do PSD deverá passar antes por fazer uma oposição sistemática e consistente, apresentando propostas diferentes para o Governo do País. Neste âmbito, acho um mau começo o prudente silêncio a que assistimos nos últimos tempos. Mas esperemos para ver.

terça-feira, 17 de junho de 2008

O regresso do buzinão.

Regressou hoje a vários pontos do País o buzinão de protesto, que tinha sido pela primeira vez ensaiado na revolta contra o aumento das portagens na Ponte em 1994. Era de prever que esse fenómeno se viesse a verificar. Efectivamente, depois das acções dos pescadores e dos camionistas, que resultaram em apreciáveis cedências por parte do Governo, e da promessa de protestos semelhantes, agora por parte dos rebocadores, taxistas e agricultores, provavelmente com os mesmos resultados, seria natural que os automobilistas comuns também quisessem participar em acções de protesto. Afinal de contas, a crise atinge-os exactamente da mesma maneira que às classes profissionais com maior poder de reivindicação. E se as forças policiais foram tão brandas perante as acções dos camionistas, ninguém espera que venham a reagir perante um simples buzinão.
O que é perturbante neste fenómeno é a sensação de que o Governo não tem um rumo preparado para responder a esta crise, andando a navegar à vista, em função das acções de protesto que continuamente surgem. Mas estes protestos sucessivos estão a enfraquecer consideravelmente o Governo. Foi o buzinão de 1994 que determinou o fim do consulado de Cavaco Silva, ao exibir uma realidade social que nada tinha a ver com o País do oásis, de que o seu Governo falava. É manifesto que este buzinão não terá as mesmas consequências, mas contribui para denunciar o presente estado de espírito das classes médias. E se os combustíveis, os bens alimentares, e as taxas de juro continuarem nesta escalada ascendente, poderemos ter uma crise de grandes proporções, em que a passividade do Governo se tornará insustentável.

domingo, 15 de junho de 2008

O referendo irlandês.


Afinal os irlandeses acabaram por dizer não ao Tratado de Lisboa. É um exercício de liberdade democrática que não pode deixar de se saudar, perante a intransigência dos eurocratas, que não aceitam que o povo de um Estado-Membro rejeite um Tratado que institui uma Europa cada vez mais distante, e em que cada vez menos os cidadãos se revêem.

Isto mesmo é demonstrado pela forma arrogante com que logo a seguir os dirigentes europeus, com Durão Barroso à cabeça, pretenderam que o resultado do referendo fosse ignorado e que a Irlanda fosse empurrada para uma espécie de limbo, onde seriam colocados os Estados que não procedam à ratificação do Tratado.

Mas já começam a aparecer na Europa políticos que, embora timidamente, resistem a continuar nesta teimosia de afastar a Europa cada vez mais dos cidadãos europeus. Neste âmbito, a recente proposta do ministro alemão Wolfgang Schaeuble de instituir a eleição do novo cargo de Presidente do Conselho Europeu por sufrágio universal é um passo na direcção certa.

Precisamos que os dirigentes europeus tenham efectiva legitimidade eleitoral, se quisermos que os cidadãos se revejam na Europa.

Mas assuma-se de uma vez que a Europa só se constrói a 27, não sendo dispensável nenhum dos Estados-Membros, nem aceitáveis diferentes velocidades na construção europeia. Respeite-se por isso a decisão dos irlandeses, afinal o único povo a quem foi permitido, por imposição constitucional, dizer o que pensava do Tratado de Lisboa.

terça-feira, 10 de junho de 2008

O bloqueio dos camionistas

Conforme se salientou aqui, e aqui, este bloqueio dos camionistas tem sido caracterizado por actos de coacção e violência, que constituem crimes previstos no Código Penal. É por isso com grande estranheza que se assiste na presença das televisões a estes actos, sem que as forças da ordem tenham qualquer intervenção. E enquanto se receia pelas gravíssimas consequências deste bloqueio no abastecimento das populações, o Governo prima pela ausência. O Primeiro-Ministro estava em Argel, donde se limitou a apelar ao diálogo e a repetir o mesmo discurso de sempre. O Ministro da Administração Interna encontra-se em Brasília. E o Ministro dos Transportes reúne com a ANTRAM, que até estava contra o bloqueio, sem que da reunião saia nada de conclusivo. É ausência e passividade a mais deste Governo perante uma das maiores crises dos últimos anos.
Apesar da condenação que me merecem os actos dos camionistas, não consigo deixar de reparar na revolta e no desespero que grassa nos rostos de pessoas, a quem esta subida do preço dos combustíveis ameaça destruir completamente os frutos de uma vida de trabalho. O Governo tem o dever de apresentar medidas que dêem resposta a esta crise, ao mesmo tempo que deve assegurar que os protestos, que são legítimos, decorram no absoluto respeito pela lei. Se não o fizer, não estará a corresponder ao que a presente situação exige do Governo do País. Há uns meses, dizia-se que José Sócrates era imbatível em 2009. Neste momento, começo mesmo a ter dúvidas que o seu Governo consiga chegar a 2009.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

O referendo na Irlanda.

Conforme se refere aqui, constitui neste momento uma incógnita o resultado da votação da Irlanda em relação ao Tratado de Lisboa. Não deixaria de ser irónico que, depois de uma decisão totalmente antidemocrática de obrigar os Estados-Membros a ratificar o Tratado de Lisboa sem sujeição a referendo, o Tratado viesse a ser rejeitado pelo povo do único Estado-Membro que, por razões constitucionais, é obrigado a realizar esse referendo. Não me parece que se chegue a essa situação, pois acredito que os Irlandeses acabarão por votar "sim" ao Tratado. Em qualquer caso, é manifesto que o afastamento que a União Europeia, com este processo, veio criar em relação aos cidadãos europeus é extremamente prejudicial. A Europa constrói-se apelando à participação dos cidadãos e não excluindo-os nas fases mais importantes da sua evolução. Internamente, não deixará de ficar para a História a decisão do PS em quebrar o compromisso do referendo em Portugal, a que disparatadamente se associou o PSD. De facto, para os partidos do arco do poder interessa mais ser visto como "bom aluno" em Bruxelas do que respeitador da palavra dada aos eleitores em Portugal.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

A vitória de Barack Obama nas primárias do Partido Democrático


Confirma-se a vitória de Barack Obama nas primárias do Partido Democrático, tendo já atingido o número mínimo de delegados necessário para conseguir a nomeação. É uma grande vitória para o senador do Illinois, que há um ano era praticamente desconhecido e que, com um discurso inovador, conseguiu fazer a diferença e vencer Hillary Clinton, a candidata que todas garantiam vir a ser nomeada. Essa é a prova de que na política não há vencedores antecipados e que qualquer candidato pode vencer, se apresentar propostas que convençam os eleitores. É por isso que, apesar do terreno que John McCain já conquistou, é bem possível que Obama venha a ser o próximo Presidente dos Estados Unidos. Yes, he can.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Viagem a Angola


Encontro-me esta semana em Angola, em visita à Universidade Agostinho Neto.
Embora se continue a ver grandes bolsas de pobreza, principalmente nos musseques à volta da capital, é extraordinário o progresso de Angola desde que acabou a guerra civil.
Neste momento, está a decorrer a campanha eleitoral para as eleições legislativas de Setembro, assistindo-se a comícios partidários que decorrem num clima perfeitamente pacifico.
Por outro lado, o investimento estrangeiro, principalmente na área da construção civil, encontra-se a atingir grandes dimensões, o que esta a provocar um grande crescimento económico, estimulado pela subida abrupta do preço do petróleo. No entanto, aqui os preços dos combustíveis são cinco vezes mais baratos do que em Portugal, o que leva a que o trafego automóvel seja enorme, causando grandes engarrafamentos.
Luanda tem o problema de ser uma cidade com excesso de população para as dimensões a que foi planeada e, segundo me dizem, nem a enorme actividade de construção consegue escoar a procura de casas, principalmente porque as petrolíferas adquirem as casas logo que são colocadas no mercado.
Em qualquer caso, Angola encontra-se neste momento numa fase de crescimento rara nos países africanos.