Confesso que depois das notícias que tinham saído nos últimos dias fiquei com alguma esperança de que o Tribunal Constitucional tivesse finalmente alterado a sua jurisprudência vaga e complacente, para o que poderia ter contribuído a recente alteração na sua composição. Mas não.
Este acórdão é mais do mesmo e confirma a minha opinião de que os cidadãos não têm os seus direitos fundamentais protegidos por este Tribunal Constitucional. O acórdão parece aliás um justificativo das decisões tomadas anteriormente, e que tanta polémica causaram. O Tribunal Constitucional insiste que é perfeitamente legítimo efectuar tributações através do corte de salários e pensões e exclui expressamente a aplicação da Constituição fiscal nesta sede, o que constitui motivo de grande preocupação. Ao mesmo tempo legitimou a tributação expropriatória na contribuição extraordinária de solidariedade (CES) dos pensionistas, com o argumento de que o que é relevante é o rendimento que fica após a tributação, o que no limite parece implicar que até uma tributação de 99% seria aceitável para o Tribunal Constitucional. E legitimou também a discriminação gritante que existe na CES, uma tributação que só abrange pensionistas, com o argumento de que da mesma resulta um corte na despesa na medida em que os Estado paga menos pensões pelo que os pensionistas não estarão em situação idêntica que os outros contribuintes. Tudo isto confirma o gravíssimo processo de substituição do texto constitucional por uma jurisprudência vaga e complacente que permite tudo e o seu contrário.
Mas afinal não permitiu tudo. O Tribunal Constitucional lá chumbou duas situações que, a meu ver, têm até menos gravidade que as outras inconstitucionalidades que deixou passar, ainda que possam ter mais impacto orçamental. Uma delas é o corte do subsídio de férias aos funcionários públicos e pensionistas. É, no entanto, curioso que o Tribunal Constitucional se tenha baseado no acórdão anterior que não teria sido cumprido pelo Governo. Efectivamente, ao manter o corte de um subsídio e aumentar os impostos para todos, incluindo os funcionários públicos e pensionistas, estes ficaram em situação pior do que estavam antes, ainda mais discriminados. Isto só significava que o Governo quis brincar com o Tribunal Constitucional. Ora, como este não apreciou a graça, resolveu não apenas repetir a declaração de inconstitucionalidade, como não limitar os seus efeitos, deixando assim o Governo com um sério problema. Tivesse ele devolvido os subsídios e inventado uma outra qualquer solução como uma contribuição extraordinária dos funcionários públicos, solidários à força, e provavelmente para o Tribunal Constitucional o Orçamento estaria na paz de Deus e dos anjos.
É por isso que continuo a pensar que os direitos fundamentais dos cidadãos não estão protegidos por este Tribunal Constitucional e que se impõe encontrar outra solução para a fiscalização da constitucionalidade. Se isto continuar assim, a Constituição deixará pura e simplesmente de existir.