Uma vez, no meu escritório, num processo administrativo o juiz mandou perguntar se, passados dez anos, o autor ainda tinha interesse na decisão. Ou seja, o processo tinha ficado em tribunal parado durante uma década, mas o juiz, em vez de pedir desculpa pelo facto, achava que isso era motivo para perguntar se estava dispensado de proferir a sentença.
É mais ou menos isto o que surge nesta proposta do governo. Os cidadãos dirigem-se ao tribunal a pedir justiça, esta não lhes é dada, e o governo aproveita para sugerir que desistam do caso, para facilitar a redução das pendências. Em contrapartida dispensa-os do pagamento suplementar de custas, a maior aberração jurídica já inventada, porque as custas que já pagaram, naturalmente que o Estado lhes fica com elas, apesar de não ter prestado o serviço que os cidadãos lhe solicitaram.
Num país a sério, não só quem apresentasse uma proposta destas estaria imediatamente demitido, como também choveriam condenações do Estado pela deficiente prestação dos serviços de justiça. Em Portugal pelo contrário o governo acha que pode brincar com o direito dos cidadãos à justiça. Enquanto vigorar esta mentalidade, o país viverá sempre numa apagada e vil tristeza.
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