Com estas declarações, Marinho Pinto vem lançar mais achas para a fogueira que tem vindo a consumir o nosso sistema de justiça. Confesso que me choca o alinhamento total do actual Bastonário da Ordem dos Advogados com as posições do Governo, em termos que não têm paralelo na história da Ordem. Se Sócrates critica o jornalismo de Manuela Moura Guedes, Marinho Pinto aparece no programa dela a acusá-la de falta de deontologia. Se Ministros do Governo surgem a acusar os magistrados de espionagem política, Marinho Pinto vem logo a seguir sustentar que têm uma agenda política e estão a tentar derrubar o Governo.
Reconheço que esta entente cordiale entre a Ordem e o Governo permitiu resolver algumas questões que afligiam os advogados, como os atrasos no pagamento das oficiosas ou a suspensão dos prazos nas férias judiciais. Parece-me, porém, que a Ordem está pagar um preço muito elevado em termos de credibilidade futura com esta actuação do Bastonário. Na verdade, ninguém ligará à Ordem dos Advogados se ela funcionar como uma correia de transmissão das posições do Governo. Numa situação de crise geral do sistema de justiça, esperar-se-ia que a voz da Ordem dos Advogados fosse antes uma referência de serenidade e de contributo para a resolução dos problemas.
A acusação de Marinho Pinto aos magistrados é tão absurda como seria a de acusar o Supreme Court americano de ter uma agenda política contra Nixon quando o obrigou a entregar as gravações do caso Watergate. Na verdade, a actividade política não se exerce à margem do Direito, não deixando os políticos de estar sujeitos à lei como todos os cidadãos, devendo abandonar o cargo quando se comprove que violaram os deveres a ele inerentes. Lembramos, a este propósito, o impeachment de Collor de Melo, salientando que quem apresentou no Congresso a acusação ao Presidente foi a Ordem dos Advogados do Brasil. É este tipo de actuações em defesa do Estado de Direito que deve competir a uma Ordem dos Advogados.
2 comentários:
Concordo inteiramente com a leitura do Professor e parecem-me pertinentes as comparações que efectuou.
Faço uma pequena ressalva quanto ao jornalismo de Manuela Moura Guedes porque, de facto, a entrevista foi claramente efectuada em tom acusatório e não no tom tendencialmente neutro que deveria ter adoptado. Mas é um facto que Marinho Pinto, ao aceitar a entrevista num jornal que era conhecido pela sua apresentação de notícias em forma de "Infotainement", bem como pela sua clara parcialidade na abordagem das mesmas, já deveria saber para o que ia - pelo que as críticas, a existir, deveriam ter sido feitas ao início em tom de advertência para o desenrolar da entrevista e como pedido de imparcialidade.
Gostaria, porém, de perguntar qual a opinião do Sr. Professor quanto às declarações de ontem do Bastonário na Universidade do Porto e que podem ser encontradas aqui: http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1511902
Mais uma vez os meus cumprimentos por mais um óptimo post.
A mim não me choca nada Marinho Pinto..antes pelo contrário...e muitos pensam como eu...
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