Quando em 2 de Abril de 1982, a Argentina decidiu invadir as ilhas Malvinas, Lord Carrington, à altura Ministro dos Negócios Estrangeiros da Grã-Bretanha, apresentou a sua demissão imediata. A Primeira-Ministra Margaret Thatcher tentou demovê-lo dessa atitude, mas ele respondeu que era uma questão da sua honra pessoal. Obviamente que o mesmo não tinha qualquer culpa de um país estrangeiro ter decidido invadir um território britânico situado a 11.000 km de distância, mas também entendeu que o Ministro dos Negócios Estrangeiros Britânico não tem condições para permanecer no cargo quando ocorre uma situação dessa gravidade no sector que tutela. Trata-se de uma questão de sentido de Estado. As instituições têm que estar acima das pessoas que em cada momento as dirigem, e elas devem ser as primeiras a entender quando a confiança dos cidadãos ficou irremediavelmente lesada.
É este tipo de atitude que muito raramente ocorre em Portugal. A Ministra da Justiça acha que assumir a sua responsabilidade política limita-se a uma declaração vazia e a um simples pedido de desculpas pelos "transtornos causados". A Ministra acha sinceramente que a questão se resolve assim? Acha que os cidadãos a quem deixou de ser feita justiça se contentam com esse pedido? E acha que os advogados, que deixaram de poder trabalhar, vão passar a ganhar os seus honorários graças às suas desculpas? E principalmente acha que as suas desculpas vão isentar de responsabilidade o Ministério que tem sob a sua tutela pelos inúmeros danos que causou?
Naturalmente que a Ministra não acha nada disso, pelo que prometeu apurar responsabilidades num "processo de averiguações". Estas responsabilidades obviamente não são as suas, mas as de outros, e convenientemente já apareceu alguém a assumi-las, dizendo que garantiu à Ministra que o sistema estaria a funcionar. Parece assim que em Portugal um Ministro acha que pode assumir que foi enganado por um seu subalterno e permanecer no cargo como se nada fosse. Hoje, por exemplo, apresentou publicamente um Anteprojecto do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Só espanta que ninguém lhe tenha perguntado se depois do CITIUS também iria paralisar o SITAF.
Só em Portugal é que os Ministros não percebem quando perderam as condições para continuar no cargo. E acima deles também não há ninguém disposto a ver o óbvio. As denúncias da situação são apenas posições de pessoas que "estão contra a reforma" ou que estão "de má fé". Na verdade, valha-nos esta gente cheia de boa fé que acha que se pode lançar o caos na área que tutela e continuar como se nada se passasse.
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